Aconteceu na noite de ontem 26/04/2011, no auditório da Sociedade Semear, o Debate Homofobia, em busca de soluções, promovida pela Secretaria de Estado dos Direitos Humanos e da Cidadania (Sedhuc) nesta terça-feira,.com as presenças do antropólogo Luiz Mott, do professor da Universidade Federal de Sergipe Marcelo Domingos e do Delegado de Polícia Civil Dr. Mário Leoni.
Luiz Mott - GGB |
Segundo Luiz Mott, fundador do Grupo Gay da Bahia (GGB) uma das organizações não-governamentais mais importantes na luta pelos direitos dos Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis e Transgêneros (GLBTT) no país. Sergipe, Bahia e Alagoas são os estados nordestinos que registram o maior número de mortes entre, Ele esteve em Aracaju para a mesa de discussão ‘Homofobia em debate: em busca de soluções’, Mott disse, em entrevista no início da tarde, que o Nordeste “tem que aprender a conviver com a diferença e com o respeito”. E emendou que a luta dos homossexuais é por direitos iguais, “nem menos e nem mais”. “Estamos vivendo aqui um ‘Triângulo das Bermudas’, pois os estados mais violentos para homossexuais são Alagoas, Sergipe e Bahia. Em Alagoas a situação é ainda mais preocupante porque está na quarta posição, atrás de São Paulo, Rio de Janeiro e Bahia”, descreveu o antropólogo.
De acordo com dados do Relatório Anual sobre Assassinatos de Homossexuais no Brasil, produzido por Mott, o Brasil ainda registra os maiores índices de assassinatos no mundo. Em 2010 foram 260 mortes (140 gays, 10 lésbicas e 10 travestis). Sergipe registrou nove casos.
“O risco de uma travesti ser assassinada no Brasil é 800 vezes maior que nos Estados Unidos, que tem uma população de 300 milhões de habitantes enquanto temos cerca de 200 milhões”, disse Luiz Mott. O número de casos registrados no Estado é preocupante se comparado com lugares cuja população é superior, como o Rio Grande do Sul. “Embora pareça pequeno, o número de ‘homicídios’ lança um grande alerta”, completou.
FALHAS
Prof. Marcelo Domi |
O professor de Antropologia da UFS, Marcelo Domungos, que pesquisa sobre os assassinatos em Sergipe desde 1994, disse que os dados coletados apontam “falhas fortes” do Instituto Médico Legal (IML) e da Perícia Técnica da Polícia. “A imperícia da Polícia muitas vezes emperra as investigações dos casos de violência. Temos vários casos que denotam falhas. Além disso os processos demoram muito a ser julgados na Justiça, fazendo com que o caso seja esquecido”, lamentou.
Por outro lado, ele disse que um evento como o desta terça-feira é histórico porque o Estado colocou na sua agenda a discussão sobre a violência contra os homossexuais. “É uma forma de reconhecer que a situação é crítica”, comentou Domingos.
O secretário Iran Barbosa assevera a declaração do professor Marcelo explicando que debater o tema sob a perspectiva dos relatórios aponta para a necessidade de atuação dos agentes públicos e para a análise da realidade, que, nas palavras dele, é cruel. “Precisamos definir políticas públicas para o enfrentamento dessa violência. Queremos que Sergipe adote políticas que vão além. O Estado pode ser referência não só no combate à homofobia, mas em toda e qualquer discriminação”, ponderou.
SEGURANÇA PÚBLICA
Dr. Mário Leoni - Delegado de Polícia Civil |
O delegado titular da 4ª Divisão de Homicídios do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) Mário Leony disse, por outro lado, que o número de casos registrados em Sergipe não indicam necessariamente que o Estado é mais violento, mas reconheceu que eles são apenas uma ‘ponta do iceberg’. “Existem estados em que o descaso é grande e muitas vezes os crimes nem são notificados. Hoje temos, por exemplo, o Centro de Referência e Combate à Homofobia, o Departamento de Atendimento a Grupos Vulneráveis (DAGV), que mostra estarmos mais atentos à questão”, explicou.
Leony acredita que é necessário que a Polícia esteja mais perto da comunidade LGBTT e saber o que leva alguns a não denunciarem a violência que sofre. “Além disso, é necessário também propor uma gestão mais democrática na segurança pública”, enfatizou.
SE MAMOÉ NÃO VAI A MONTANHA...
Infelizmente, não fomos. Muitos alunos e professores ficaram decepcionados por não terem ido ao debate na noite de ontem. A secretaria Municipal de Educação informou que não era possível a liberação do ônibus por ter sido solicitado muito em cima da hora (ou seja, a 15 dias antes apenas e por não ter sido contemplado com um Projeto). Mas, como diz o ditado: ... se Maomé não vai a montanha, a montanha virá a Maomé, pois em conversa com o Delegado de Polícia Civil Dr. Mário Leoni, o professor articulador Diógenes Almeida, está tentando junto com outros órgãos do Governo Estadual (eu disse: ESTADUAL) e com a Universidade Federal de Sergipe, trazer esse debate para a nossa Escola. “Será a primeira vez que uma escola municipal desse porte promoverá um debate dentro de nossas dependências com pessoas tão renomadas.”. Enfatizou o professor.
ENTREVISTA LUIZ MOTT PORTAL INFONET.
O antropólogo e fundador do Grupo Gay da Bahia, Luiz Mott, esteve em Aracaju para participar de um debate em torno de um dos mais debatidos, e por isto mais polêmico, assuntos no tocante aos homossexuais: os crescentes casos de homofobia. Mott apresentou dados do Relatório Anual sobre Assassinatos de Homossexuais no Brasil, que aponta 260 casos de assassinatos em todo o país (140 de gays, 10 de lésbicas e 10 de travestis). Sergipe, como nove casos, está em 9º lugar sendo que ocupa a 22º posição em número de habitantes.
Em entrevista ao Portal Infonet o ativista comenta os dados do relatório que é apresentado anualmente e fala sobre o polêmico Projeto de Lei 122 (PL 122) que se aprovado tornará crime a discriminação aos homossexuais.
Portal Infonet - O Relatório Anual sobre Assassinatos de Homossexuais no Brasil, produzido pelo Grupo Gay da Bahia (GGB), fundado por você, aponta que ser homossexual no Brasil ainda é algo intolerável. Quão preocupantes são esses dados. Há algum avanço?
Portal Infonet - O Relatório Anual sobre Assassinatos de Homossexuais no Brasil, produzido pelo Grupo Gay da Bahia (GGB), fundado por você, aponta que ser homossexual no Brasil ainda é algo intolerável. Quão preocupantes são esses dados. Há algum avanço?
Luiz Mott - O Brasil registra o maior número de assassinatos no mundo. Imagine que, em 2010, nos EUA, foram assassinadas 14 travestis; no Brasil, 110. O risco de uma travesti ser assassinada no Brasil é 800 vezes maior que nos Estados Unidos, sendo que lá há 300 milhões de habitantes e aqui temos cerca de 200 milhões. Essa minha estada aqui e um apelo que faço para as secretarias de educação, como já fiz para o próprio ministério da cultura e para o da educação, que agilizem a implantação de uma política de educação sexual, distribuindo o kit contra a homofobia - que não vai fazer propaganda, não vai fazer proselitismo da homossexualidade, vai fazer é propaganda de direitos humanos para que os estudantes gays, lésbicas e travestis não sejam vítimas dessa perseguição que acontece nas escolas, sobretudo contra os homossexuais. É um apelo para a Polícia e delegados para que investiguem cuidadosamente os crimes contra homossexuais para que a impunidade não leve a novas ocorrências; à Justiça, que seja célere e severa em julgar e sentenciar os autores de crimes contra homossexuais.
Exposição Homofobia |
Mott trouxe uma exposição de cartazes de camapanhas contra homofobia
Infonet - De que forma, então, o homossexual pode contornar essa situação em tais circunstâncias?
LM – O que fazemos é um apelo à comunidade de gays, travestis e lésbicas para que se acautelem mais: tenham mais cuidado, não leve pessoas desconhecidas para casa, selecione mais os seus parceiros e, querendo ou não, em uma sociedade como a que vivemos hoje em dia, todos têm que tomar cuidado, sobretudo quem é mais vulnerável. E o homossexual, o gay, a travesti e a lésbica são pessoas muito vulneráveis porque são discriminadas dentro de casa. Enquanto o negro, o deficiente e o judeu aprendem em casa a enfrentar o preconceito, os gays não. Os pais discriminam, espancam, expulsam de casa.
LM – O que fazemos é um apelo à comunidade de gays, travestis e lésbicas para que se acautelem mais: tenham mais cuidado, não leve pessoas desconhecidas para casa, selecione mais os seus parceiros e, querendo ou não, em uma sociedade como a que vivemos hoje em dia, todos têm que tomar cuidado, sobretudo quem é mais vulnerável. E o homossexual, o gay, a travesti e a lésbica são pessoas muito vulneráveis porque são discriminadas dentro de casa. Enquanto o negro, o deficiente e o judeu aprendem em casa a enfrentar o preconceito, os gays não. Os pais discriminam, espancam, expulsam de casa.
Infonet - Ainda segundo os dados do relatório, Sergipe registrou nove casos de assassinatos contra homossexuais. Quão preocupante essa estatística é?
LM - Na verdade o número embora pareça pequeno, com nove homicídios contra homossexuais - ou ‘homocídios’, como eu digo - temos que lembrar que cidades e capitais com maiores populações tiveram menos assassinatos. Por exemplo, o Amazonas, o Ceará, o Rio Grande do Sul, que tem cinco vezes mais a população de Sergipe, teve menos que nove assassinatos. De modo que nós estamos vivendo, aqui, em um ‘Triângulo das Bermudas’. Os estados mais violentos contra os homossexuais têm sido a Bahia, Sergipe e Alagoas. Em Alagoas a situação é ainda mais preocupante porque depois da Bahia, do Rio de Janeiro e de São Paulo, foi o mais violento. Sendo que o estado tem uma população de cerca de 3 milhões de habitantes. O Nordeste tem que aprender a conviver com a diferença, com o respeito. O que nós queremos não é privilégio, queremos direitos iguais, nem menos e nem mais.
Infonet – Os crimes contra homossexuais têm alguma característica específica?
LM - Os crimes contra homossexuais, também chamados crimes homofóbicos, entram na categoria jurídica de crime de ódio. São motivados por alguma condição específica da vítima ou sua origem racial, étnica ou a sua orientação sexual e eles são geralmente cometidos com requintes de crueldade: muitos golpes, muitas facadas, muitos tiros, tortura, e, no caso dos homossexuais, castração e empalação, ou seja, colocam algum objeto dentro ânus para realmente humilhar, desonrar aquele indivíduo que em vida ostentava um estilo de vida que o assassino considerava ou discaração, ou crime ou pecado.
Infelizmente no Brasil ainda não há estatísticas oficiais sobre crimes de ódio. Não se sabe, como nos Estados Unidos e na Europa, quantos indivíduos foram agredidos ou assassinados devido à sua condição por religião ou orientação sexual, etnia, raça etc. É fundamental que o estado, através de suas delegacias municipais, estaduais e federais registrem cada ocorrência policial a orientação sexual do indivíduo para que a punição seja de acordo com a gravidade do crime. Porque se foi um crime de ódio, de raça, sexo ou religião, tem que ter um agravante.
Infonet – O assunto ‘homofobia’ ainda é muito polêmico. O episódio em que se envolveu o deputado pelo Rio de Janeiro Jair Bolsonaro (durante entrevista a um programa de TV ele fez declarações ofensivas a negros e gays, fato que gerou grande repercussão na internet) mostram que o tema ainda é tabu? Ou esse foi um caso isolado?
LM - Na verdade o deputado Jair Bolsonaro representa um caso extremo, mas há muitos ‘Bolsonaros’ pelo Brasil afora que também têm ódio, querem espancar, querem discriminar, querem matar o homossexual. Nós queremos que o Bolsonaro seja severamente punido de acordo com o Código de Ética da Câmara dos Deputados e que sirva de exemplo para que a impunidade não provoque novos ‘Bolsonaros anti-homossexuais’.
LM - Na verdade o deputado Jair Bolsonaro representa um caso extremo, mas há muitos ‘Bolsonaros’ pelo Brasil afora que também têm ódio, querem espancar, querem discriminar, querem matar o homossexual. Nós queremos que o Bolsonaro seja severamente punido de acordo com o Código de Ética da Câmara dos Deputados e que sirva de exemplo para que a impunidade não provoque novos ‘Bolsonaros anti-homossexuais’.
Infonet – O Projeto de Lei 122 que tem por objetivo tornar crime a homofobia, uma das maiores pautas de reivindicação do movimento gay no Brasil ainda não foi votado. Seria o caso de haver uma maior pressão por parte dos maiores interessados nele?
LM - Apesar dos gays, lésbicas e travestis representarem 10% da população brasileira, aproximadamente 20 milhões de pessoas, a grande maioria ainda vive presa dentro do ‘armário’ e ainda não teve a consciência e coragem de se assumir publicamente na família, na escola, no trabalho, na vizinhança... A pressão do movimento homossexual tem sido constante, mas ainda é insuficiente. É necessário que nossos amigos aliados, tais como os heterossexuais, os pais de gays, os amigos de homossexuais, os deputados, os professores universitários, se manifestem apoiando o que não é um privilégio, apenas o reconhecimento de que gay também é ser humano, que deve ter a mesma proteção dos demais cidadãos.
Infonet – Mas existe um certo mito de que o projeto criaria uma certa ‘redoma de vidro’ para os gays...
LM - O PL 122, que equipara a homofobia ao racismo, não faz nada mais nada menos que considerar que homossexual é ser humano igual ao negro, ao índio e as demais minorias étnicas. Nós não queremos privilégio. Nos só queremos que, se alguém na rua chama um gay por ‘seu veado discarado’ ou se chama ‘seu negro discarado’ o crime seja igual, que tenha a mesma punição. Nós pagamos impostos, cumprimos os mesmos deveres de cidadania, mas somos tratados como indivíduos de terceira categoria.
Ninguém escolhe ser homossexual. Até agora não existe nenhuma teoria que explique definitivamente a origem da homossexualidade, de modo que as pessoas, os meninos, as meninas, a partir dos seis anos já se descobrem diferentes, na adolescência afirmam e confirmam a sua orientação sexual e felizmente a televisão, os jornais, a mídia não discriminam tanto quanto antigamente. Já não há insultos na imprensa, se algum órgão faz algo do tipo ele é punido, mas não é fácil. O que é fundamental é que a família acolha bem seus filhos, seus parentes homossexuais. A cada quatro famílias uma tem algum ente homossexual e também de cada quatro homossexuais um, em alguma vez na vida, tentou suicídio, porque a discriminação é muito forte.
Por Diógenes de Souza